Blog Pro Wrestling Portugal: outubro 2007



Contra-Corrente: O Regresso à Lagoa Azul

Publicado por Ricardo em 26 de outubro de 2007 às 12:05 da manhã.

As sequelas costumam deixar sempre um sabor amargo. Desvanece-se o factor surpresa, e já não tem grande interesse repisar o assunto batido. Porém, a resposta que o meu colega de Blog “Jay Lethal” deu ao último texto que coloquei neste espaço motiva-me uma nova edição dedicada ao mesmo tema, que será a última. Tentarei não me repetir muito (se bem que algum nível de sobreposição é essencial), para não tornar monótono um local que pretendo tornar exactamente no contrário.

As falhas de comunicação existem em todo o lado, e o seu tamanho é tão maior quanto maior for o número de interlocutores envolvidos na conversa. Existindo uma mensagem a circular entre um emissor e um receptor, se essa mensagem não passa, a responsabilidade é dos dois: do que não entende, e do que não se consegue explicar. É um mal de que padecem muitos professores e alunos por esse país fora em todos os níveis de ensino. Todos já tiveram um professor a quem pedem para explicar melhor alguma matéria, e ele mais não faz do que repetir o mesmo que já havia dito. E eu, aqui, não vou simplesmente reafirmar mais do mesmo.

Esta última analogia não é totalmente correcta. Isto porque não quero ser pretensioso e colocar-me na figura de professor. Mas quero mostrar que já passei de aluno há muito tempo (se bem que nunca deixemos de aprender durante a vida). Vejo Wrestling há mais de 15 anos, assisti à maioria das grandes mudanças, e por isso acho algo confuso que seja acusado de ignorância quando calmamente tento avançar tantos argumentos e exemplos, e mostrar que fiz o meu trabalho de casa. Se me perdoam a piada, o meu texto anterior começou por ser “estereotipado e banal”, depois deixou de ser banal, depois já só dava uma visão estereotipada das indys; a evoluir desta forma, por este caminho, mais três ou quatro posts e chego a Nobel da literatura...

Assim, mais uma vez, quero começar por tentar desvendar simplificadamente aquele que é o meu ponto essencial: existe um tipo de federações, as indys, que por um fenómeno curioso apela a um determinado tipo de público que pulula pela Internet, mas que não tem interesse nenhum para o fã médio de Wrestling. Existem várias explicações para isto. É certo que não têm a divulgação da WWE, mas a generalização da Internet devia fazê-las chegar ao público em geral e não apenas ao público especializado, e às pouca dezenas de pessoas que assistem aos espectáculos ao vivo. A verdadeira explicação não é por certo a divulgação.

Por vezes, como agora, sinto uma espécie de snobismo velado, que não se confessa mas anda no ar e é demasiado espesso para não se cheirar. É o snobismo de se dizer que “quem vê a WWE são aqueles tipos ignorantes que não entendem nada disto, e só querem um show fácil e aborrecido”. “Nas indys é que está a acção”. E por isso dei-me ao trabalho de tentar explicar que esta opinião não é nada óbvia e muito menos clara (convém esclarecer, por uma questão de honestidade intelectual, que apesar das aspas nunca escutei nada assim explicitamente; mas não sejamos hipócritas: na atitude do “se deres uma hipótese, se te informares vês que até é bom” está essa arrogância da certeza absoluta). Na minha opinião, sustentada pelas razões que adiantei, as indys são até o contrário do que advogam ser: são um local aborrecido onde nada acontece que perdure na memória, mas do qual se tem uma imagem simpática e idealizada. Ou seja, uma Lagoa Azul.

Diz um provérbio chinês que os homens tropeçam nas pedras pequenas e não nas grandes. Por isso, em segundo lugar quero deixar claro que não sou um particularista, um especialista, alguém que se perde nos pormenores deixando de ter uma visão de conjunto. As generalizações são perigosas, mas se vistas e entendidas com os devidos cuidados, as devidas ressalvas e excepções, têm um papel único no nosso entendimento do Mundo. Portanto, não vou responder caso a caso a todas as particularidades, os combates supostamente interessantes ou as tiradas orgásmicas que as indys proporcionam a quem as aprecia. Isso seria entrar num debate estéril, difuso e incoerente de exemplo e contra-exemplo. Os exemplos são úteis como ilustrações de regras gerais, mas não se substituem ao papel sistematizador que uma teoria genérica desempenha. Por cada bom combate nas indys aponto dez sem interesse. Por cada bom combate na WWE, apontam-me dez sem interesse também. Aquilo que para uns tem piada, para outros não tem piada nenhuma. É por isso que esse debate é inútil. Não gosto de arrastar pedras até ao cima da montanha, para que de novo elas rolem, como Sísifo.

Posto isto, passo a tentar expressar de forma diferente a mesma opinião que já aqui tinha ficado. Penso que as federações ditas independentes falham naquilo que apontam como as suas armas fortes. Uma dessas armas é a legitimidade. E este termo tem de ser bem entendido. Não é legitimidade no sentido de “ah, os nossos shows não têm guião, isto é mesmo a sério”. É a legitimidade tipo Kurt Angle, de “os nossos são simplesmente melhores”. Melhores atleticamente, melhores criativamente. E isso parece-me simplesmente falso, por duas razões. A primeira é que, por um processo de semi-selecção natural, os melhores nas indys acabam por ser recrutados pelas principais federações, quando mostram verdadeiramente sê-lo. Em segundo lugar porque a existência de guionistas nos shows da WWE que controlam as ideias dos lutadores implica que não acontecem momentos parvos ou desinteressantes que por vezes se criam no momento. Mas perguntem a qualquer lutador ex-WWE, e todos dirão, excepto em certos casos ressentidos, que os guionistas aproveitam as suas ideias.

É certo que na WWE nada pode correr mal, e portanto não se arrisca tanto em termos de movimentos, histórias, personagens, etc. Mas isso não é necessariamente mau. Como diz Lance Storm, ser-se booker de um espectáculo de Wrestling é muito simples: pega-se num tipo bom, pega-se num tipo mau, dá-se ao público uma razão para que eles não se suportem e para que queiram ver o bom bater no mau num pay-per-view, e ponto final. Este é o modelo clássico, que trouxe o Wrestling até onde ele está hoje. Mas, diriam os amantes do independente, “será que não adianta tentar inovar, que as indys não são afinal uma lufada de ar fresco neste modelo repetitivo”?

E a minha resposta é que não. A minha analogia dos ratos e das bolachas, também ela totalmente incompreendida, dizia isso mesmo. É um instinto normal, evolutivo, para todos os mamíferos, procurar sempre algo melhor mesmo perante uma recompensa certa. Só que nós, humanos, temos uma capacidade que mais nenhum tem, que é a capacidade de reflectir, de parar para pensar, de colocarmos a nossa capacidade de análise ao serviço dos nossos interesses. E esse atributo pode mostrar-nos que há modelos e sítios onde não adianta procurar algo melhor, e que mais vale ficarmos com a bolacha que já sabemos ser boa.

No Wrestling, e na minha opinião, repito, sustentada em argumentos, exemplos e factos, cujo julgamento fica à consideração do leitor, esse sítio inóspito são as indys. A novidade que trazem, como tenho tentado explicar, não é o futuro da indústria, porque não fornece um modelo consistente alternativo ao modelo clássico tipo WWE. Aliás, nem sequer concordo que a WWE esteja estagnada. Se alguém tem mudado ao longo do tempo, mesmo tendo estado sempre na vanguarda, tem sido a WWE. A empresa não está a viver os melhores tempos da sua história, mas ainda consegue surpreender nas suas criações, nos combates que proporciona, num simples “SAVE_US222”.

Defendo que o circo que rodeia o Wrestling é tão importante quanto a acção em si, a “violência”, se quisemos usar esse termo batido. Esse circo são as personagens, as histórias, a envolvência. Oponho-me com toda a veemência a à imagem de que literatura é nos livros, porque odeio compartimentos estanques, artificiais. Há lugar para grandes narrativas no Wrestling. “Quem diz que tenho razão?” Ninguém. Mas se algum honestamente é capaz de defender que se consegue tornar uma luta falsa numa luta interessante sem conhecermos a personalidade dos indivíduos no ringue e porque se estão a espancar, acho que é difícil dialogar com essa pessoa. Essa ideia contraria radicalmente todos os factos da história deste desporto até hoje. E eu prefiro a certeza das evidências ao relativismo da moda das indys. “Mas as indys não têm também personagens profundas, e histórias interessantes?!” Parece-me óbvio que não, até pela falta de aderência do público, mas melhor do que discutir isso, parece-me, é fazer a seguinte experiência de pensamento. Coloque-se um espectador ocasional de Wrestling a ver um combate entre dois desconhecidos da WWE, ou mesmo da OVW, e dois desconhecidos de uma indy qualquer. Faça-se aí um “Pepsi Challange”, em que não se diz a quem visiona os combates qual é qual. No final, pergunte-se a essa pessoa (1) de qual gostou mais, e (mais importante) que (2) lhe descreva o que aconteceu no ringue. Penso que a minha previsão de resultados desta proposta de experiência é óbvia.

É esse tipo de justificações que faz com que, tal como tinha afirmado anteriormente, as indys vendam a “legitimidade” que depois rejeitam. Uma tese importante, que aqui enuncio de forma obviamente caricatural, é que “nós temos chain wrestling, e spot fests espectaculares, não somos meninas como a WWE”. O problema é que até nos estilos de luta de que as indys abusam inconsequentemente, ainda assim a WWE faz melhor. Chain Wreslting é aquilo que um certo William Regal faz, e Spot Fests são todos os combates da dupla London/Kendrick. Mas fazem-no integrado em narrativas, em contextos onde isso faz sentido, com comentadores que o relacionam com um todo coerente, no universo da federação e do desporto. “Isso é ignorância, não o fazem tão bem nem sequer de forma parecida” - parece que ouço os contestatários digitais. Mais uma vez, tudo depende do modelo que queremos ver no Wrestling. Eu não sou defensor da WWE em si, mas sim do seu modelo de Wrestling. Sou defensor que o Wrestling é, acima de tudo, entretenimento misturado com desporto. Se lhe retirarmos alguma das duas componentes, ele torna-se num pobre órfão.

Ser diferente é, na minha opinião, um bem em si mesmo. Mas procurar sê-lo à força, para mim, pode não o ser. Penso que aqui chegado está na hora de procurar conciliar posições. É natural para todos nós tentarmos encontrar num tipo de espectáculo o nosso canto, especial e que nos define, por não ser um fenómeno global onde não nos sentimos diferentes nem identificados. O mesmo se vê na música. Quando pouca gente conhece uma banda, é “a nossa banda”. Quando muita gente a conhece e gosta, é “comercial”, é “vendida”. Sentimo-nos traídos, tal como se de um(a) namorado(a) se tratasse. A nossa banda já não é só nossa, agora é de todos. E o Wrestling é igual. As indys são a tal banda pequena da qual temos tendência a gostar porque ainda há espaço para nos identificarmos com ela. Eu compreendo, aceito, e até acho salutar que isso aconteça. E acho esta uma explicação perfeitamente plausível, não banal, não estereotipada, nem sequer produto de ignorância.

Ao meu colega Ricardo, deixo um abraço, e mesmo não gostando do estilo, espero vê-lo por aqui a colocar muita informação no nosso Blog sobre federações independentes. Não estou com isto a ser hipócrita, pois acredito verdadeiramente que tudo tem o seu espaço, e há pessoas que crêem verdadeira e genuinamente que as indys são melhores que a WWE. Acredito na diversidade, e quero vê-la posta em prática. Mas também acredito na discussão de ideias, pois só assim poderemos verdadeiramente ficar esclarecidos e mais conhecedores. Conhecedores dos outros, e também de nós mesmos.

Lagoa Azul, as Indys, a IWC, os meus 5 centimos sobre o assunto, resposta ao post anterior

Publicado por Lucas Neves em 19 de outubro de 2007 às 6:55 da tarde.

Quem caminha por foruns onde eu esteja registado e onde o assunto é pro-wrestling sabe que eu sou um grande fãs das indys. Desde os meus inícios de fã de wrestling que me fiz fã da Ring of Honor, e no ultimo ano tenho encontrado na IWA-MS e na Chikara grandes formar de entretenimento, tendo deixado por completo de ver WWE.

A bolacha continua no sitio, eu é que já não gosto do sabor. Felizmente desde o inicio da sua história que o Homem não se satisfaz com o que tem e partiu à procura de algo de novo, não fosse isso, viveríamos ainda todos em cavernas.

Culturalmente, é hoje aceite que os jovens namorem e tenham práticas sexuais antes do casamento. É bom? Claro que é, mas podemos fazer melhor, eu luto para que o termo 'namoro' comece a desaparecer do dicionário, juntamente com o conceito de fidelidade. O sexo não tem obrigatoriamente de ter contornos espirituais, e não é por fazer sexo com x que vou gostar menos de y. por isso luto por essa evolução, procuro indivíduos que partilhem da ideia, mesmo sabendo que tenho a bolacha actual no sitio.

Evoluir é bom. e eu sou uma pessoa que agradece pelo que tem e que compreende que não merece praticamente nada do que tem. Eu agradeço a bolacha, e agradeço aos homens que lutaram para criar a bolacha... mas seria uma traição a esses homens se eu não continuasse o seu trabalho, e tentasse criar/procurar uma bolacha ainda melhor. Até chegar à melhor bolacha.

Utópico? Talvez, mas todos devemos ser guiados por ideias utópicas, mesmo que não chegue-mos lá temos de tentar chegar o mais próximo possível do que é justo/melhor.

Passando para o wrestling (e tomando quase esta resposta aquele modelo aborrecido de de quote do post original seguído de resposta, quota do post original seguído de resposta, quote do post original, etc) e entendendo a WWE como bolacha. Há muito que não vejo um show da WWE, por isso não sei exactamente o que andam a fazer, mas a ultima vez que vi um show o programa estava completamente estagnado... Nada que eu não tivesse visto. claro que as indys também têm fases destas (ex. ROH nos finais de 2006), mas as indys têm uma grande vantagem sobre a WWE: o ego dos writers não se sobrepõe, os wrestlers tem liberdade para dar asas à sua criatividade.

Palavra chave: criatividade. A qualidade das indys tem base antes de tudo no facto de os seus principais wrestlers serem individuos altamente criativos. É olhar toda a saga Jimmy loves Lacey na ROH, é olhar para a personagem criada pelo Delirious, é ver qualquer show comentado pelo Eddie Kingston, é ver um show de Chikara e ver gelados e formigas a lutar, é ver a entrada do Nate Webb (por esta altura um dos meus wrestlers preferidos), é ver num combate de 8 gajos ir tudo jogar voleibol, é ver o infame CM Punk vs Homicide falls count anywhere que foi parar a um strip club, é ver pessoas como Bryce Remsburg, Josh Abercrombie, Jim Fannin, Arik Cannon, Chuck Taylor... raios, tanta gente, não são exepções, são a regra, são as pessoas que fazem que haja público nos shows indys.

Claro que a WWE também tem gente criativa e um grande roster, e sobretudo gente que representa bem... mas a forma como os writers tomam conta do programa aliado ao seu próprio modelo televisivo com limitações de tempo e obrigação de criar feuds seja como for de forma a criar um PPV com interesse prejudicam a qualidade do programa..

Defende o senhor Ricardo Teixeira que o wrestling das indys é tão legitimo quanto o da WWE. Se se o quiser entender à letra claro que é, mas quando se usa essa expressão quer-se dizer que nas indys se vai encontrar um estilo diferente do da WWE. Eu dificilmente alguma vez terei falado em legitimidade ou terei presenciado um debate em que isso fosse argumento, e como também não o entendo vou aqui fazer um exercício de interpretação com base nos meus conhecimentos.

E vou fazer a interpretação em 2 pontos fundamentais. primeiro, stiffness: dar chapadas, pontapés e forearm strikes com força tal que faça um estrondo forte. Pessoalmente sou fã, ajuda-me a acreditar que os gajos se magoam, torna o combate em si mais interessante de seguir. A violência é uma parte importante do wrestling, não quer dizer que não se possa fazer um bom combate sem violência, mas quanto mais violentos forem os golpes melhor, simbolizando uma coisa ou outra... a mensagem entende-se melhor quando o golpe é feito de forma stiff. E se uma pessoa for ver wrestling só pelas historinhas está mal, porque para histórinhas existem senhores como Lev Tolstoi, Fiodor Dostoievski, Georges Simenon, Arthur Connan Doyle, António Muñoz Molina ou Mário de Carvalho que têm uns escritos por demais interessantes.

Segundo ponto de interpretação: mat/chain wrestling, um estilo morto na WWE, e que a certa altura teve um sucesso interessante nas indys com wrestlers como John Walters, Chad Collyer, Matt Stryker e mais notoriamente Alex Shelley, Bryan Danielson ou Nigel McGuinness, mas que também nas indys não tem o espaço que já teve noutros tempos. O fã distraído pode argumentar, "ah e tal, mas a ROH tinha até um Pure Title", pois, só que essa Pure Title com as Pure Rules tinha piada pelas estratégias que proporcionava com o facto de cada wrestler ter um limite de Rope Breaks, e teve sucesso fundamentalmente no reinado do McGuinness em que ele contornava as regras de forma humorística de forma a obrigar os adversários a usar rope breaks (fazer-lhes um wristlock e empurrá-los para as cordas, o Sinclair fazia na perfeição o papel de árbitro não muito inteligente) e acabou mesmo por ser retirado. ainda assim, é inegável que para encontrar este tipo de combates as indys são os melhores lugares, para além dos nomes que referi, encontramos outros lutadores capazes de se adaptar a este estilo, e fundamentalmente, capazes de dar a um estilo de wrestling à partida menos entusiasmante um sentido e transformá-lo em histórias emocionantes, aí encontramos nomes como Austin Aries, Roderick Strong e mesmo Mike Quackenbush, Chris Hero, Claudio Castagnoli ou Homicide, e anteriormente o senhor Jamie Noble.

Segundo argumento anti-indy do sr. Teixeira: golpes espetaculares = spotfest, no que eu teria de discordar... primeiro, não há nada de mal em ter spotfests, há spotfests de qualidade e com momentos verdadeiramente incríveis... outros nem tanto, mas mais uma vez, os melhores spotfests estarão nas indys, onde os atletas de menos porte terão mais oportunidades. Os shows não tem de ter de inicio ao fim o mesmo tipo de combates, por isso é sempre agradável ter um combate mais rápido e com mais acção. mas também os golpes espectaculares vão surgir noutros combates... não há problema nenhum em ter golpes espectaculares, num show recente da IWA-MS o Devon Moore fez um SSP de topo de uma carrinha escolar e por pouco eu não comecei aos saltos e a gritar "holy shit", porque de facto, que aquilo foi incrível foi. Estes 'holy shit' moments têm alguma tendência em acontecer nas boas indys e não me parece que possam ser criticáveis do ponto de vista de qualidade do programa.

E para terminar o que pior me caiu... então nas indys os combates não contam histórias? Os wrestler não têm presentes conceitos de psicologia? É um argumento irrisório e fundamentalmente um argumento de quem não conhece o que está a tratar, porque na WWE não há mais psicologia/workrate que nas melhores indys, se quiseres combates e links respectivos terei todo o gosto em apresentar-tos, porque pelo o teu discurso tenho aqui muitas coisas de que deves gostar (e talvez comeces a compreender porque é que tendo poucos fãs, as indys tem em percentagem muitos fãs diehard).

Carisma e personagens desinteressantes? Aqui, o melhor era sacares 1 ou 2 shows para modificares a tua opinião, nas indys há montes de personagens divertidissimas, carismáticas, com promos fenomenais. eu rio-me legitimamente em shows indys, aliás, costumo caracterizar uma certa promoção como "o local onde sociopatas criativos arranjam emprego". Uma coisa que gosto bastante na ROH por exemplo é a forma como para além de personagem, praticamente todos os wrestlers tem objectivos e uma certa densidade psicológica que faz com que haja interesse nas personagens mesmo que estas não estejam a ser propriamente pushadas. Tens mesmo que sacar um show bem aconselhado, porque podia dar-te muitos exemplos que poderias considerar como exepções... pois, não são, as principais promoções indy abundam em carisma. Aliás, já dei 2 videos de youtube numa resposta mesmo ao teu post e que tu os consideraste de "humor parvinho", no primeiro caso, um heel colocava um wrestler de nome Player Uno em pause ao carregar-lhe no botão pause (referencia aos videojogos e tal...), no segundo Darrin Corbin (um homem também bastante divertido) e um dos Olsen Twins lutam em camara lenta, com Bryce Remsburg a arbitrar em camara lenta e com o publico a cantar em camara lenta "this is awe some". é parvinho? Sim, mas as indys são também para pessoas que gostam de parvoíces, a Chikara fundamentalmente, apresenta uma abordagem mais humorística ao wrestling.

Depois o exemplo do Morishima... o Morishima não tem carisma? porque não fala? Ah, então vou dizer que o Undertaker não tem carisma também...

Olhar para a cara do Morishima e não ver lá carisma é algo que me ultrapassa, pelo menos a cara do homem é carismática. de resto, teve um reinado jeitoso onde apesar de não falar cumpriu bem o seu papel, e sobretudo, foi um reinado diferente do ultimo reinado longo da ROH. Sem handshakes, sem combates técnicos, só porrada rápida e alguns combates de valor... se quiseres falar em contar uma história tens o vs Aries como principal exemplo. Quanto a interagir com o público... sempre achei piada à expressão facial dele quando respondendo aos "boooooos" do publico colocava os polegares para baixo como quem diz "têm razão, esta gajo é fraco".

Depois o outro ponto do discurso: isto só interessa aos fãs da indys, não interessa aos fãs gerais. pois, mas isso a WWE também só interessa aos fãs da WWE e não interessa aos fãs gerais de televisão ou de teatro.

E sobretudo, não é argumento, porque uma coisa por haver mais gente a gostar dela não se pode tornar pior ou melhor, desse modo seriamos obrigados a gostar todos da mesma coisa... nesse aspecto não tenho problema nenhum em fazer parte de uma sub-cultura e assumo-o com todo o gosto.

Mas há um factor que não é referido uma unica vez e que é fundamental, o da acessibilidade... claro que as indys estão over na IWC, é na internet que surgem os downloads delas, é na internet que eles têm mais visibilidade. Agora um puto que vê WWE e nunca ouviu falar de ROH vai gostar de indys como? Porque vê um cartaz na rua?

Se as indys tivessem mais visibilidade parece-me certo que atrairiam mais gente, por exemplo, numa campanha de martking que eu considero inteligente, a ROH tem enviado bilhetes de borla a pessoas que compraram bilhetes para PPVs da WWE na mesma zona. Nos reports constam que tais pessoas se divertiam com o show mesmo não fazendo ideia de quem era quem à partida...

Eu acho que o produto da ROH é muito agradável para fãs gerais de WWE... a não ser que se veja WWE por aquele entertenimento fantástico que é ver divas em bikini... eu por acaso excito-me mais com a Mickie Knuckles a levar com lighttubes na cabeça, a sangrar abundantemente do braço e a trocar cabeçadas brutais com o Tank.

Falas depois no CM Punk... treino? A OVW é um 'treino'? Claro que também se aprende coisas lá, mas eu vejo aquilo muito mais como um teste. O Punk teve a sorte de apanhar o Heyman e de ter tido aquela grande feud com o Albright... Mas quanto a aprender, só se foi a dar pontapés e a fazer promos em menos tempo. De resto, não tem muito que saber, na WWE faz combates pequenos, usa o mesmo move-set, simplesmente não pode improvisar e em combates que era suposto durar 20 minutos durarem mais de 90. Claro que se teve de adaptar a um novo estilo, mas isso não faz com que o novo estilo seja melhor que o antigo. Com o Albright aconteceu o contrário, na OVW era o rei, na ROH demorou a adaptar-se.

O Joe está estancado na TNA? Acabou de vencer o Christian! o Mick Foley é fã dele... ou o Foley também não percebe de wrestling? Não é o melhor promeur nem tem carisma por aí além, mas é intenso no ringue, e competente q.b. eu não sou fã do Joe... mas há combates em que vibro e sei reconhecer o seu talento...

O Homicide é rei na ROH? O Homicide até se pode ter tornado rei, mas não foi a primeira vez que lá meteu os pés... antes teve de mandar com umas bolas de fogo à cara do Joe, causar muitos problemas, passar por brawls com Danielson e Colt Cabana, até turnar face para ajudar a ROH na guerra com a CZW, passando depois pela feud com o Cornette que terminou com a vitória do ROH title... num reinado que serviu apenas para ajudar a estabelecer dois heels nas suas duas únicas defesas: Chris Hero e Jimmy Rave. era um rei? Pelo menos um individuo importante na história, mas para chegar lá demorou, foi preciso trabalho e ajuda do booking... por não ser main eventer na TNA quer dizer que se houvesse uma aposta maior nele não tinha capacidade? É discutível, mas parece-me que tem talento para ser um midcard.

Quanto ao bash à IWC... não sei porque foruns é que andas, mas sei que há muita gente estupida... que se há de fazer? É irritante? É, mas também são irritantes os putos a fazer 619s no bar quando um gajo quer beber um cafézito sossegado e não é por isso que vou dizer que os fãs da WWE em geral são parvos (embora não me reveja na maior parte das suas opiniões. na minha opinião, estes fãs não traduzem a maior parte dos fãs das indys... no forum da ROH muita gente segue ainda WWE, muita gente gosta de WWE e do Cena, outras não gostam... está no seu direito, se reparares, esse discurso que criticas acaba por se aproximar do discurso que fazes contra os fãs das indys no final do teu texto.

Falas ainda do Briscoes vs. MCMG, dizes que viste uma promo, suponho que queiras dizer que viste o combate (a promo em que os MCMG aparecem de surpresa para desafiar os Briscoes é muito boa, com o pormenor delicioso final "agora se nos desculpam, temos um avião até Orlando para apanhar", e suponho que não estejas a falar disso).

Quanto ao combate em si, a minha opinião expressa no fórum lusowrestling: "E houve outros tag teams que apreciei ao nível deste que me parece um combate desprovido de psicologia e storytelling, acho que muitas pessoas o overratam porque não estão habituados a ver o Shelley e o Sabin em equipa e por isso não conhecem a cena deles, eu como já fui vendo algumas coisistas já estava familiarizado com o move set e não me impressionei tanto gostei mais por exemplo do Shelley e Sabin vs Jacobs e Black"

Eu gostei do combate, mas a expectativa é uma coisa que fode tudo... se me dissessem "saca que foi um combate do caralho" eu ficava desiludido, como o vi enquanto vi o show entusiasmei-me e ainda comi umas boas near falls. Os combates não têm de ser todos iguais, e este tipo de combates também tem o seu lugar (embora os Briscoes exagerem um pouco nesta formula). As pessoas que ovarratam o combate do que eu li foram sobretudo as pessoas que o viram live, o que eu acho normal. outras depois seguiram, porque há combates que ficam no goto das pessoas sabe-se lá por quê.

Num exemplo similar, quando vi o Tables Match entre o BJ Whitmer e o Brent Albright fiquei "holy shit" e isso tudo. Mas vi também no forum da ROH um rapaz todo chateado porque lhe tinham dito que era MOTYC e ele depois detestou o combate. É por isso que eu pior que spoilers de resultados agora odeio mesmo é spoilers de "grande combate" e similares.

Apesar de tudo, Briscoes vs MCMG é um combate que se lhe cortasses algum tempo tinha uma boa reacção da base de fãs normal da WWE que em termos de wrestling por wrestling reagem sempre mais a estes combates.

Não sei o que é que já viste de indys para ter formado uma opinião tão forte sobre o funcionamento das indys apesar de compreender a irritação que certo tipo de fãs causam.

Gostava que pudesses dar a estas promoções uma chance e tentares talvez sacar um show (terei todo o prazer em te aconselhar) e vê-lo na tentativa de te divertires (porque se fores vê-lo à procura de defeitos claro que os encontras e podes fazer um super texto de como montes de coisas não fazem sentido... mas se fizerem essa sobre-análise também a um show da WWE acontece-te o mesmo).

Se digo que o texto é estereotipado falo da representação que tens das indys, que não me parece de todo correcta. A mim também me aconteceu pensar que os wrestlers deathmatches era só uns gajos parvos e que aquilo não era wrestling mas quando vi depois gajos como Necro Butcher, Ian Rotten, Mad Man Pondo ou Mickie Knuckles mudei por completo a minha opinião, e encontrei um grupo de wrestlers carismáticos e interessante.

Num total aparte, a proposito do Necro Butcher só duas quotes traduzidas que na altura me pareçam deliciosas:

1ª - Num show da IWA-MS em que havia uma espécie de torneio de Strong Style vs Hardcore havendo 3 combates com essa gimmick, BJ Whitmer distrai Richards e Necro aproveita para o vencer com um Small Package levando a que depois Whitmer e Fannin subissem ao ringue para atacar Richards, Necro "ah e tal, já não tem nada a ver comigo". Passado um bocado do ambush "ah, se calhar não devia ter deixado que o tivessem atacado" sobe ao ringue e pede desculpas a Richards. sei que não soa a coisa mais engraçada do mundo, mas como em tudo, o contexto e a interpretação fê-lo ter valor.

2º - Depois de um combate pela #1 conterdership do titulo hardcore em que Corp. Robinson e Necro empatam por double pinfall, Fannin diz que não se importa que ambos tenham uma shot num 3 way pelo titulo, reacção de Necro "I think I would win if we continued the match... but let's have some beers instead".

Conta-Corrente: A lagoa azul

Publicado por Ricardo em 10 de outubro de 2007 às 10:01 da tarde.

Têm sido historicamente atribuídas ao ser humano muitas características que não existem no restante reino animal. São tipicamente as características da mente, que na ortodoxia de praticamente todas as religiões se consagram à alma. Porém, muito do que é considerado inefavelmente nosso constitui apenas uma versão exagerada de uma tendência que partilhamos com muitos outros animais, e em particular com mamíferos, nossos parceiros genéticos.


Num documentário acerca de ratos, recentemente exibido pela RTP2, apresentava-se uma experiência curiosíssima. Um rato, quando colocado num labirinto, consegue descobrir e "anotar mentalmente" o caminho que o conduz a uma bolacha de chocolate. Se colocado no mesmo labirinto uma segunda vez, o rato segue direito à bolacha. Encontrou o seu prémio, encontrou aquilo de que gosta. Mas quando o processo se repete, o rato faz algo muito curioso: apesar de saber o caminho, ele não vai direito à bolacha. Ele segue a via da curiosidade em deterimento da obtenção de uma recompensa certa, e tenta outros caminhos inexplorados, em busca de algo melhor do que uma bolacha.


Pelo menos nisto, não somos diferentes dos ratos. Apenas exageramos o efeito. É isto a curiosidade humana também: é esquecermos aquilo que temos por certo como bom, e vermos no desconhecido o canto da sereia, considerando a busca da perfeição como uma alternativa à certeza do belo. É isto que nos faz progredir enquanto espécie, e enquanto indivíduos na sociedade. Aquele que não se contenta com o que tem possui uma vantagem muito significativa perante aqueles que se resignam às suas conquistas presentes. A diferença entre um humano e um rato neste assunto é que nós temos capacidade preditiva, podemos antever se a busca que encetamos terá ou não um bom resultado. Não seria natural gastar recursos a perfurar a superfície da terra à procura de outro combustível que não petróleo.


O problema surge quando se esquece esse equivalente certo que é o presente, e se parte em busca de quimeras inexistentes. A extrema teimosia humana leva alguns a desafiarem todos os limites da racionalidade, e a procurarem encontrar o seu paraíso, ao qual foram os primeiros a chegar, e que é melhor que o paraíso de todos os outros, aqueles que ficaram para trás. É a síndrome "Lagoa Azul", um filme dos anos 80 onde duas crianças perdidas numa ilha deserta encontravam ali um modo de vida único, e nunca viriam a conseguir adaptar-se à civilização. O filme foi popular por perpetuar esse mito tão querido à parte romântica das nossas ideias, o mito do bom selvagem, que de certa forma é também um reflexo dessa busca por algo inatingível.




Acredito que no wrestling se passa algo de semelhante. A WWE é o status quo, é a nossa bolacha de chocolate. O seu wrestling tem qualidade enquanto entretenimento, o que apesar de tudo é uma componente essencial deste semi-desporto. E, relativamente à qualidade intrínseca dos combates (nunca ouvi uma única boa definição do que isso seja), alguns dos seus Main Eventers são os melhores de toda a indústria.


Apesar de serem um fenómeno mais antigo, pequenas federações supostamente independentes, ou indys, vieram ocupar o vazio de poder que saiu das Monday Night Wars, e da compra pela WWE da WCW e ECW. As indys são o canto da sereia, são a lagoa azul. Destas indys exclui-se apenas a TNA, que sempre teve sonhos delirantes de vir a competir com a WWE, e portanto foi alimentar-se dos melhores Wrestlers das indys, e metê-los num show muito WWEsco. Com os resultados desastrosos que se vêem.


No fundo, o que é que separa as indys, e sobretudo o seu expoente Ring of Honor, da WWE? Os seus fãs dirão que o Wrestling é mais autêntico, com mais golpes aéreos espectaculares, personagens interessantes e sem lutadores gigantescos e toscos. Dirão também que têm uma ligação grande com os fãs, e que os shows são coerentes e fazem sentido. Dirão também que os lutadores são, afinal de contas, melhores.


O problema é que todos estes argumentos são mentira. As indys são tão autênticas como a WWE, apesar de venderem o seu produto como se tivesse a legitimidade da luta-livre olímpica. Há um culto semelhante nas Mixed Martial Arts, mas que fica para outras núpcias. Quanto aos golpes aéreos, há uma expressão que classifica esse tipo de combates: spot fest. Argumentar com golpes espectaculares é esquecer algo fulcral: sim, o Wrestling deve ser atlético, mas acima de tudo um combate feito com guião tem de contar uma história. Um bom momento assombroso, com uma manobra perigosa, apenas tem significado no momento correcto, e não de forma indiscriminada, repetindo-se ao longo de um combate. As personagens dos lutadores nestas federações são também geralmente desinteressantes e as promos aborrecidas. Tão aborrecidas como as da TNA, mas ainda mais temperadas pela falta de carisma de quem as executa. E para quem acha que não há gigantes toscos nas indys, já viram o japonês ex-campeão da ROH? Sem carisma não há ligação com o público. Não, estas federações quanto muito têm uma ligação com o pequeno culto que se instala em torno de si, não com a generalidade dos fãs de wrestling.



Mas então será que não têm coisas boas? Claro que sim. Quase todos os grandes lutadores começaram nas indys. O meu ponto é exactamente esse: se alguém é bom nas indys, ele é imediatamente captado pelas grandes federações (terei de falar no fenómeno CM Punk?). E não é à toa que a WWE os faz passar por um rigoroso programa de treino, onde devem reaprender tudo o que pensavam saber até então. A TNA não o faz. E qual o resultado? Samoa Joe foi um rei na ROH, tal como Homicide, apenas para citar alguns nomes. Hoje, parecem estancados nas posições onde se encontram. Não têm grande chama, nem apelam particularmente a ninguém, lá está, a não ser à mesma sub-cultura que os tornou vedetas.



As indys apenas têm expressão e significado por via da Internet, onde os chamados smarts, fãs de Wrestling que se acham muito inteligentes por deslindarem as storylines, e saberem que o Wrestling tem guiões (ao bom jeito do descobrir a pólvora depois da guerra), lhes fazem uma promoção sem rival. Estas pessoas seguem unicamente o mesmo instinto que todos seguimos quando construímos um herói, e depois o descartamos. Estas pessoas recusam que a WWE seja o melhor que o Wrestling tem para oferecer, mesmo que tenha sido quem as introduziu na modalidade. Muitas simplesmente já não vêem a WWE (o que não as impede de fazerem correr muitos electrões com mensagens anti-John Cena, provavelmente esquecendo o trambulhão que a WWE levou nas audiências com a sua lesão... mas esse assunto fica para a próxima semana). Agora, procuram algo melhor, e julgam tê-lo encontrado nas indys.


Acredito que, para algumas pessoas, tal possa mesmo ser uma opinião sincera, e traduza um legítimo gosto pessoal. Mas, para muitas, é querer ver qualidade onde ela não existe, porque fica bem gostar de algo que os outros não conhecem. Dá bom assunto para conversa de café, e faz-nos parecer informados. Mas e se todo o Wrestling fosse indy? Isso seria o fim da indústria. Pela minha parte, e sei que pela parte da generalidade dos fãs, eu deixaria de ver Wrestling. Vi recentemente uma promo de dois meninos bonitos dos smarts, os Motor City Machine Guns, com os Briscoes da ROH, que é de apetecer entrar no ringue para bater naqueles indivíduos, para tentar acordá-los. Claramente escolheram a carreira errada. Back flips, como diria BG James, não são tudo.


Sou essencialmente fã de Wrestling. No Wrestling, prefiro a WWE, mas não desminto que exista lugar para tudo, inclusive para as indys. Mas na Internet, que apesar de tudo continua a ser a principal ou mesmo única fonte de notícias de Wrestling, e isto quer nacional como internacionalmente, começa a ser cansativo ver um conjunto militante de fãs, que tipicamente dominam a escrita em sites ligados à modalidade, com afirmações enviezadas sempre para o mesmo lado. E uma mentira, se for afirmada muitas vezes, torna-se mesmo verdade. Assim, convencem-se não só os outros, como os próprios que o escrevem a si mesmos. É cansativo este unanimismo, que se esconde atrás de afirmações pseudo-jocosas e vazias, mas na verdade demasiado sérias para algo que, afinal, deveria apenas ser divertido. O Wrestling, com ou sem 450º Splash, é entretenimento. Lidem com isso.

Ding dong

Publicado por Royce Gracie em 4 de outubro de 2007 às 12:04 da tarde.


Saudações, fadistas da minha terra.

Há vezes em que os melhores planos saem frustrados e nos obrigam a voltar à estaca zero. O Mirko Filipovic pensava conquistar o título de campeão da UFC em 3 combates, mas um KO e uma costela partida depois dá por ele em situação pior do que quando chegou à organização americana. Também o Vince McMahon pensava que tinha encontrado no John Cena o campeão da Raw para os próximos 10 anos, mas eis agora que uma grave lesão veio afastar o Cena dos ringues durante pelo menos seis meses e obrigar a Raw a voltar a ter uma disputa séria pelo título de campeão. Ainda se considerou a hipótese de manter o Cena como campeão durante o período de recuperação, mas infelizmente o hospital tem uma política que proíbe a entrada de spinner belts.

Quem me conhece sabe por certo que jogo muito bem à bola e que tenho um enorme sucesso com as mulheres, e por esta altura desconfiará talvez que nutro um ódio profundo (em oposição a um ódio raso) pela gimmick do Cena. No fundo nem a sei definir bem, que já não é a de white rapper do início, mas sei que já não posso com o homem a enterrar adversário atrás de adversário enquanto se passeia pelo ringue com as cuecas de fora dos calções. Contudo não fiquei de forma alguma contente com esta lesão. Em primeiro lugar porque a lesão afecta o homem e não o lutador, e tudo o que leio sobre o Cena enquanto pessoa é francamente positivo. Em segundo porque já dizia o lendário Ric Flair “To be the man you’ve gotta beat the man”, ou seja, a maneira de um campeão ser realmente aceite é vencendo o campeão anterior. Desafortunadamente a vaga de lesões que se tem abatido sobre a WWE, em especial sobre lutadores de topo, obrigou a que muitos campeões abdicassem dos seus títulos e que fosse preciso organizar à pressa battle royals para encontrar novos campeões. Ora uma coisa é apanhar um adversário de costas e atirá-lo por cima da corda superior, e outra coisa bem diferente é vencê-lo 1-2-3 no meio do ringue depois de um combate de preferência emocionante. Além disto, o novo campeão tem de viver sob o espectro do anterior, que embora lesionado nunca perdeu efectivamente o cinto.


Aos fãs do Cena resta o consolo que ele aproveite a estadia no hospital para gravar mais um ou dois CDs de rap, e a certeza de que quando ele regressar terá um push nunca antes visto na história do wrestling. Não é de todo descabido imaginar que ele vencerá todos os títulos das várias brands, incluindo o feminino e o cruiserweight, nem tão pouco que será criada mais uma mão-cheia de títulos especialmente para ele. Parece que já o estou a ver a dirigir-se para o ringue com um carrinho de mão cheio de cintos, no meio de gritinhos histéricos de adolescentes e de vaias de homens adultos, imunes ao efeito “Oh meu Deus, ele tirou a camisa, é tão bom, acho que vou desmaiar”.

Até essa data inevitável, a WWE vai ser obrigada a fazer o que provavelmente não pensava fazer antes da reforma do Cena: encontrar outro campeão. Pelo motivo que já referi, é importante que este novo campeão seja coroado da forma mais convincente possível. Uma opção seria dar o título ao Triple H ou porventura a um regressado Shawn Michaels, dado que ambos são já lendas do wrestling e que por isso seriam aceites pelo público mesmo ganhando o título numa battle royal ou coisa assim. Outra alternativa seria o Chris Jericho, a confirmar-se o tão propagado regresso, vencer logo o título na sua estreia. Receio contudo que isso não lhe fosse granjear muitas simpatias no balneário, além de que mesmo para o público seria estranho ter como campeão alguém que até à semana passada nem sequer fazia parte do roster. O nome do Randy Orton também está provavelmente em cima da mesa, mas depois da derrota clara com o Cena no SummerSlam penso que seria um grande erro porem-no campeão assim do nada. Por mais que tenham tentado fazer passar a imagem de que a lesão no peito do Cena tinha sido provocada pelo RKO, acho que até o gordo do “It’s still real to me, dammit” percebeu bem que a lesão aconteceu logo no início do combate com o Mr. Kennedy. E é justamente este que eu vejo como a melhor escolha para novo campeão. O homem ganha o título e anuncia que o Triple H trocou os testes de paternidade e que ele (Kennedy) é que é o verdadeiro filho do Mr. McMahon. Aí pode começar um feud com o Trips que culminará na conquista pelo narigudo do 11.º título na WrestleMania 24. Já o Randy Orton fica entretido com o regressado Shawn Michaels, que alegadamente tem passado este tempo todo no estaleiro devido ao pontapé que levou na cabeça. Ficam todos com bons feuds, portanto.


Só para terminar, não sou médico mas achei muito estranho que o combate do Cena com o Mr. Kennedy não tivesse sido interrompido imediatamente a seguir à lesão. É nítido que logo a seguir ao segundo hip-toss o Cena chamou o árbitro para lhe dizer que estava lesionado. O combate foi então obviamente rushado, mas acabou por parecer um bocado ridículo já que o Cena não conseguia mexer o braço direito. Teve de se livrar de um headlock só com o braço esquerdo, bloquear a cabeçada nas escadas só com o esquerdo e até no STFU teve de agarrar o braço direito com o esquerdo para dar a impressão que o golpe estava minimamente aplicado. E depois deste esforço ainda vem o Orton mostrar que com o RKO consegue deixá-lo incapaz de responder a uma contagem de 10? Para quê? Nessa altura já se devia adivinhar que o main event previsto para o No Mercy não se iria realizar, e quem nos diz que os minutos adicionais em que o Cena esteve a combater e a apanhar do Orton só com um braço para se defender não lhe agravaram a lesão? Eu compreendo que tenham querido dar hype para o No Mercy, mas naquela altura o mais importante era protegerem o Cena. O combate devia ter sido interrompido logo na altura, declarado no contest, e se depois se viesse a confirmar que a lesão do Cena era falso alarme ele e o Orton podiam ter aparecido na SmackDown para fazerem então o RKO. Agora porem a maior máquina de dinheiro da WWE a arriscar agravar uma potencial lesão grave é que não me parece ter sido uma ideia muito esperta.

As melhoras, Cena.